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Teremos Solução para os desafios do setor Elétrico?

Ainda é prematura qualquer opinião a respeito de como serão conduzidas as ações pelo MME, de forma que sejam solucionadas as atuais questões que afligem e afetam os agentes do setor elétrico, e que se arrastam sem solução há alguns anos.
A urgência é a palavra na ordem do dia para que possamos ver encaminhadas as propostas e soluções. No entanto, seria leviano de nossa parte exigir uma solução de problemas antigos em período inferior a 60 dias de governo instalado, em que pese estas soluções estarem amplamente discutidas e em sua maior parte consensadas entre os agentes.
Dentre mais de uma dezena de temas importantes e urgentes que demandam encaminhamento por parte do Governo e que afetam as atividades do setor elétrico no momento, selecionamos neste artigo apenas três deles, sobre os quais gostaríamos de destacar alguns pontos críticos e de grande importância, com o objetivo de reviver e reafirmar as discussões e debates que tem ocorrido com frequência.

I.GSF:

Muito já foi dito sobre o GSF, mas a solução ainda não veio. As distorções de mercado permanecem e a liquidação financeira na CCEE ainda não foi paralisada pela paciência dos agentes e pela atuação positiva da CCEE, mas isso tem prazo para acabar, se nada realmente for feito.
No mercado livre, “spreads” negativos nos preços em relação ao PLD distorcem o valor de mercado da energia negociada, em função da incerteza de recebimento dos volumes financeiros na liquidação financeira mensal da CCEE. Ou seja, o que se vê como preço de mercado, esqueça-se que é real, pois é artificial em função de uma conjuntura regulatória e de mercado negativas.
A raiz do problema se divide em muitas ramificações, desde a omissão do Poder Concedente em revisar a Garantia Física das Usinas desde 2003 (a EPE anunciou que está trabalhando ativamente numa proposta para o MRE e atualização das Garantias Físicas), que deveria ser realizada quinquenalmente, passando pela judicialização da questão onde quem pode pagar os melhores advogados tem vantagem, transformando os agentes em classes diferentes, de acordo com o seu poder de mercado e condições de ter decisões judiciais favoráveis que os colocam em vantagem em relação aos demais. Não se pode condenar esta prática, pois cada um que procure se defender da ausência de regulação adequada que evitasse tais distorções, mas a distorção na regulação não está correta, induz a vantagens indevidas e falta de isonomia, prejudicando a maioria dos agentes e afetando o correto funcionamento do mercado.

II. Implementar a transição do modelo de leilões regulados com a participação crescente do mercado livre na expansão do sistema:

Não há como ser otimista (e não é confortável este ceticismo) em relação à possibilidade de transição do atual modelo para um outro modelo onde o mercado livre participe efetivamente
da expansão da oferta de energia. Se o modelo mercantil não for alterado muito rapidamente, todas as propostas visando este objetivo não serão mais que vãs intenções.
Os leilões regulados continuam ocorrendo. Este ano já temos a sinalização de realização dos leilões A-4 e A-6 onde, por enquanto, a regra estabelece que somente as distribuidoras deverão participar como compradoras da energia a ser negociada.
Este fato somente ampliará o portfólio de contratos regulados e volume de energia comprado pelas distribuidoras, o que torna gradativamente mais complexa a transição dos chamados “contratos legados” das distribuidoras, comprometidas com eles além de 2043. Estes contratos são um grande desafio para a transição para um novo modelo no setor. Deve-sepermanecer aumentando este percentual de contratação das distribuidoras?
Será muito importante nos próximos leilões regulados ainda em 2019, que a transição se inicie, com a alteração no modelo dos leilões, de forma que se possa iniciar gradualmente a participação do mercado livre nestes certames. Não há sentido em se pretender uma ampliação do mercado livre e o Governo continuar a realizar leilões regulados sem levar em consideração esta perspectiva, e permanecer restringindo os contratos apenas às distribuidoras.
Enquanto isso, já há iniciativas próprias dos agentes no mercado com a negociação bilateral de projetos de geração traduzindo-se em contratos de médio e longo prazo entre geradores, consumidores e comercializadores de energia, visando exclusivamente o atendimento ao mercado livre e sua expansão. Instituições financeiras tem participado deste esforço.
Já há casos concretos de PPAs celebrados entre usinas eólicas e comercializadoras ou consumidores (recentemente, apenas como um exemplo, as empresas Casa dos Ventos e Vale anunciaram a celebração de contrato de longo prazo no ambiente livre), e um sem número de avaliações de negócios similares estão em andamento pelos agentes envolvidos no ambiente livre.
As comercializadoras, por sua vez, estão diversificando atividades para crescerem cada vez mais, partindo para negócios muito além da compra/venda de energia, e estão sofisticando suas operações, envolvendo eficiência energética, geração distribuída, gestão de energia, armazenamento e investimentos em geração própria, além de outras iniciativas, que as fortalecem como empresas e prestadoras de serviços.
Estamos vivenciando alguns problemas recentes com “default” de algumas grandes comercializadoras, que surpreenderam o mercado. No entanto, o segmento de comercialização é maduro, robusto e eficiente, apresenta crescimento contínuo e seguro desde o inicio dos anos 2000. Esta não é a primeira crise vivenciada pelo segmento de comercialização de energia, que conta com empresas sérias, de portes diferenciados (o tamanho da empresa em nossa opinião não importa tanto quanto contar com empreendedores e profissionais sérios, honestos e competentes), que certamente superarão este momento. Esta experiência servirá para o amadurecimento dos agentes e das regras que regem o mercado, como já vimos ocorrer em eventos similares no passado.

III. Abertura do Mercado Livre:

Foi louvável e aplaudida pelos agentes atuantes no mercado livre, a iniciativa do governo anterior ao publicar a Portaria 514 no dia 28 de dezembro de 2018, permitindo a redução de 3 MW para 2,5 MW no limite para que consumidores atendidos em qualquer tensão possam escolher seu fornecedor a partir de 1º de julho de 2019. Em 1º de janeiro de 2020, a faixa mínima passará para 2 MW.
A CP 33/MME prevê a liberação total do grupo A para opção de migração ao mercado livre até 2028. Este prazo pode ser criticado, discutido e revisto para prazos menores com o que concordamos, mas se implantado oficialmente o cronograma é uma indicação de vontade política para a abertura do mercado, seja em que prazo estiver estabelecido.
A ampliação do mercado livre levará a resultados positivos para os consumidores de energia elétrica, no caminho da valorização de sua maior participação nas decisões do setor e na sua influencia benéfica nas ações que visem auxiliar a gestão da operação e comercialização de energia, através de resposta rápida e segura pelo lado da demanda.
Depende de vontade política do Governo e do Congresso Nacional a tramitação exitosa do PL 1917/2015 na Câmara dos Deputados, onde está inclusa toda a proposta da CP 33 e a portabilidade da conta de luz, que viabiliza a reforma do setor elétrico, e do PL 10.985 já aprovado no Senado e com perspectiva de aprovação breve pela Câmara dos Deputados, onde também estão inclusos pontos importantes para a evolução do setor e uma possível solução para o GSF. É preciso que tenhamos oficializados em Lei a abertura do mercado livre e o encaminhamento de temas importantes como a separação de energia e lastro, que já poderia influenciar na realização dos leilões regulados e na participação mais efetiva do mercado livre na expansão da oferta de energia no sistema, conforme preocupação exposta acima neste Artigo.
Enfim, há inúmeros outros desafios no setor, sejam conjunturais de curto prazo ou estruturais de longo prazo, e este espaço não permite discorrer sobre todos. Confiamos na vontade política do ministro Bento Albuquerque e equipe recém empossada, da ANEEL, da EPE, Associações e demais instituições do setor, em especial ONS e CCEE, para que haja a sensibilidade sobre o momento por que passa o setor elétrico brasileiro, e que suas ações venham ao encontro das expectativas dos agentes para a evolução do modelo de gestão do setor, e em consonância com as propostas contidas na CP 33, amplamente debatidas pelos agentes e motivo de valiosas contribuições para sua implementação.